O seu conhecimento empresarial é um ativo ou um passivo?
Imagine o conhecimento da sua empresa como a geladeira da sua casa. Se você sabe exatamente onde está cada item, o que está fresco e o que está perto de vencer, você tem um ativo: prepara refeições de forma rápida, eficiente e sem desperdício. Agora, se sua geladeira é uma zona caótica, com itens vencidos escondidos no fundo e ingredientes frescos inacessíveis, você tem um passivo: perde tempo, gasta dinheiro e, no final do dia, a comida estraga.
No Talk da Inbix sobre a importância de organizar processos e conhecimentos na sua empresa, com a participação de líderes de empresas do ecossistema, o evento mergulhou fundo na dor que a maioria das organizações sente, mas poucas sabem como curar: transformar o caos do conhecimento em um ativo estratégico.
O bate-papo foi fundamentado em dados reais: uma pesquisa com 34 empresas clientes revelou que a maior dor não é a falta de conhecimento, mas sim o difícil acesso a ele. Como destacou um dos participantes, o conhecimento hoje “é igual iogurte: ele vence”. E uma empresa que opera com “iogurte vencido” está fadada a perder eficiência.
Onde Começar? O Dilema entre Pessoas e Processos
A primeira provocação do talk foi direta: por onde começar a mapear? A resposta foi quase unânime: comece pelas pessoas e pelo cliente.
Sara, especialista em gestão humanista da Niké, foi enfática: “a gente começa pelas pessoas. E começa pela pessoa mais importante, é a que te dá resultado, que é o cliente”. Ela defende iniciar pelo “macroprocesso da jornada do cliente”, usando a filosofia Lean para identificar o que realmente agrega valor e o que é desperdício de tempo.
“Eu sempre uso o exemplo da TAM do tapete vermelho. Parecia muito legal de marketing, mas a Gol veio e desbancou, porque aquilo não era importante para o cliente.”
Ela também fala sobre as pessoas que trabalham no processo. Muitas vezes os empresários estão relutantes em tirar pessoas da linha para desenhar os processos, mas esquecem que não existe gestão de processos sem pessoas. “As pessoas movem o processo. As pessoas precisam construir juntas”.
Everson, da Mont Kóya, reforçou essa visão, trazendo a perspectiva da tecnologia e da indústria. Para ele, processos feitos com uma visão mais gerencial se tornam mais frios: “não envolve as pessoas no seu dia a dia”. Para entender a posição da empresa, o quanto ela quer evoluir, é fundamental ter as pessoas junto e dar ferramentas para que elas consigam enxergar o processo como um todo.
“Porque é muito fácil chegar lá e entregar um papel escrito no fluxo bonitinho ali, e agora você faz isso. Mas qual a ferramenta que ela vai usar? Qual o caminho? Quais as etapas do processo?”
Falando sobre ferramentas, Cassiano compartilhou um case que aconteceu durante o MBA, onde Fernando Maranhão, da Águia Florestal, criou um prompt para mapear processos. Com o próprio áudio, explicando como fazer determinada atividade, no Chat GPT, e o chat criava um prompt para colocar na ferramenta Miro, que faz o desenho detalhado do processo.
Da “Infotoxicidade” aos Processos Prioritários
Um dos maiores problemas identificados foi o excesso de informação, a “infotoxicidade“. Com uma média de 14 canais de comunicação (WhatsApp, e-mail, Teams, etc.), as empresas estão “poluindo o que era importante com o que era apenas interessante”.
Como organizar esse caos? Busato, Diretor de Operações da Dunexa, compartilhou uma metodologia prática que estão utilizando neste momento dentro da empresa:
- Usar o Sipoc: Uma ferramenta simples (Supplier, Input, Process, Output, Customer) para definir e listar todos os processos, até mesmo em um Excel.
- Criar Indicadores: O time começou a questionar como medir a eficiência de cada processo interno, criando indicadores específicos, mesmo que não comerciais. Por exemplo, “número de técnicos 100% aptos”, para medir a conformidade da equipe com as exigências da indústria.
- Priorizar com Base em Métricas: O RH listou 15 processos (gestão de folha, férias, cargos, salários, etc) e os classificou por “prazo”, “padrão” e “impacto financeiro”. Dando notas de 1 ao que importa pouco, 3 para o médio impacto e 6 para o que tem alto impacto. O resultado? “Cargos e salários e gestão de férias são os dois primeiros que precisamos mapear”, pois eram os que mais impactavam o cliente e o custo, ao contrário de “rodar a folha”, que já era um processo maduro.
Essa priorização, como destacou um participante, foi crucial porque “a diretoria não falou o que era importante. Foi chamado o pessoal dos setores para ouvir delas, pela experiência delas, o que estava impactando.”
O Conhecimento é um Filho (e precisa de manutenção)
Um dos pontos altos do debate foi a desmistificação do “processo de prateleira”. Rafael, da Amplifique.me, trouxe a dura realidade das startups: a eficiência nasce da necessidade (“a gente não tinha dinheiro”).
Rafael também reforçou uma das falas do Cassiano durante o evento, de que conhecimento tem data de validade. Ele alertou que um processo documentado não é um projeto concluído.

“O PlayBook é tipo um filho. Você fez e você vai ter que ir dando manutenção. Cuidar, senão às vezes ele mais atrapalha do que ajuda.”
Ele compartilhou um caso real onde uma nova vendedora “fez um monte de coisa errada” por seguir um processo no Notion que estava desatualizado. A lição foi clara: “foi pior ter o processo mal escrito ou desatualizado do que não ter processo nenhum”. É preciso que o processo tenha manutenção.
A solução? Ter um “dono” para o processo, um “CPF responsável” por mantê-lo vivo, garantindo que ele seja atualizado (a sugestão foi documentar aprendizados em até 48h) e que tenha um critério de expiração.
Tecnologia como Aliada: IA e Ferramentas Práticas
A tecnologia, especialmente a IA, foi apresentada não como uma solução mágica, mas como um catalisador para o conhecimento estruturado. “A IA funciona bem com conhecimento estruturado. Quanto mais informação, pior para a inteligência artificial”, foi um consenso.
Agne, da Mahle, mostrou como eles usam a plataforma Inbix para dar poder à linha de frente. Os operadores de caixa, por exemplo, não precisam decorar 30 instruções operacionais. Eles simplesmente digitam na IA da plataforma: “como eu lanço uma venda de alguma coisa diferente?” e a ferramenta “já puxa a instrução ou o regulamento”.
Síntese Final: Ninguém Quer Trabalhar no Caos
O Talk da Inbix provou que mapear processos e gerir conhecimento é menos sobre ferramentas e mais sobre cultura, empatia e colaboração. Começa em ouvir a dor do cliente (externo e interno) e em focar no que realmente agrega valor.
Como resumiu Fábio, do SuperDr., ao falar sobre a complexidade da saúde, o sucesso veio ao “ter um líder de processo” (um enfermeiro chefe) e ao unificar as jornadas do paciente em uma plataforma, transformando dados em métricas.

O principal ensinamento do Talk, no entanto, foi capturado na fala da Sara ao analisar a dificuldade de um cliente em reter talentos:
“Assim, acho que você não tem um problema de pessoas. Você tem um problema de processo, ninguém quer trabalhar no caos. Você tem um processo que é um caos. Ninguém vai parar nessa vaga… enquanto você não melhorar o processo, ninguém vai parar ali.”
A lição final é que estruturar o conhecimento não é um luxo administrativo, é a base para a eficiência, a retenção de talentos e o crescimento escalável. É, fundamentalmente, parar de deixar o “iogurte vencer” na geladeira da empresa.
